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Impeachment e ódio, POR YVONNE MAGGIE

Viajar de táxi com Luiz Alphonsus, meu marido, é uma experiência única. Final de tarde. O trânsito difícil como sempre. Íamos, ele e eu visitar minha sogra. Ele que em geral fala do cosmos, das suas realizações no campo da arte, do trabalho que acabou de realizar, danou a falar de política com o jovem motorista de seus vinte e poucos anos.
De repente, o motorista mostrou seu celular com o anúncio da manifestação organizada para domingo dia 15 de março. O rapaz falava exaltado: “Vamos levar vinte milhões de pessoas para o planalto”. Perguntei como se não soubesse: “Mas para que mesmo querem ir à Brasília?” A resposta veio imediata: “Para pedir o impeachment da presidente, e eu estarei lá”. Fiquei muda. Tive medo do ódio que senti na voz do nosso condutor.
 
A conversa foi indo entre o motorista e meu marido que dizia que a ditadura não era solução. Que os militares matavam quem não comungasse de suas opiniões e que muitos amigos seus haviam morrido nas mãos dos torturadores. Sair de casa naquele tempo era temerário, disse Luiz Alphonsus. O motorista ouvia incrédulo “Mas era mesmo assim? Eles matavam os opositores? Quando foi essa ditadura?” Luiz Alphonsus continuou didático. Chegamos ao nosso destino e saltamos do carro. Nesse momento tive a certeza de que algo estava muito errado.
 
O que faz com que um motorista de táxi, de vinte e poucos anos, se mobilize para pedir o impeachment da presidente dois meses após sua reeleição? O que significa o ódio que senti em sua  voz? E nem se precisa pegar táxi. Basta olhar o Facebook para sentir a animosidade, sem contar as vaias que nossa presidente recebeu ao visitar uma feira de construção civil em São Paulo no dia dez de março último.
 
Como explicar o clima de revolta? Não aceito de maneira alguma um processo de impeachment da presidente se nada lhe desabona a não ser o fato de nos parecer ter mentido muito na sua campanha eleitoral. Quem nos diz que ela não acreditava que poderia realmente dar ao povo brasileiro “rios de leite e montanhas de cuscuz” como prometeu? Mas o fato é que ao estelionato eleitoral sentido pelo povo se somou a crise econômica e uma avassaladora revelação de que a base aliada do governo está implicada na roubalheira de milhões ou bilhões da Petrobras.
 
O povo aceita que políticos roubem e mintam. Quantas vezes já ouvimos dizer que todos os políticos roubam. Quantos já nos disseram que eles mentem para ganhar votos? Um conceito de política próprio aos brasileiros e uma aceitação fatalista dos fatos. Mas o que teve esse roubo e essa mentira eleitoral de diferente das outras? Por que o ódio?
 
A enorme quantidade de dinheiro e o tamanho da mentira é, para muitos, o xis da questão. Foi demais, disse minha sábia manicure. 
 
De fato, desde junho de 2013 o povo nas ruas por todo o país, os economistas de várias tendências dizendo que deveria haver mudanças profundas na condução da política econômica e nada foi feito, nenhuma resposta dada na campanha eleitoral da presidente e menos ainda agora quando a crise se instalou. A isso se somam anos de um mantra dito pelos petistas que diariamente culpavam indivíduos pelas nossas desigualdades e pela pobreza. A “culpa” é da “burguesia branca”, dos ricos, diziam. O mantra acabou, como um bumerangue, se voltando contra seus formuladores.
 
Talvez as questões acima elencadas expliquem o ódio contra a nossa presidente e uma conclamação para que ela saia do governo, como se isso fosse resolver alguma coisa.
 
Não vou à manifestação a favor do impeachment. Não votei em Dilma, não concordo com a política do governo que assumiu o poder, mas não acho que é hora de pedir o afastamento da presidente. Como já disse acima,  de que adiantaria? É hora de exigir mudanças na condução da coisa pública. A democracia é uma experiência difícil porque implica aceitar a crítica para que portas se abram e novas soluções apareçam. Não adianta enfiar a cabeça como avestruz, como foi feito até aqui pelos condutores da nossa política recente.

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