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Os rumos da sustentabilidade no Brasil, por AMÉLIA GONZALEZ

É claro que o acordo entre Estados Unidos e China sobre emissões de carbono esteve em pauta nesta segunda-feira (17)  no lançamento do estudo "Diretrizes para uma Economia Verde no Brasil", na sede da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS) em São Conrado, no Rio de Janeiro. Na palestra de abertura, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, citou o pacto e lembrou que ele traz os elementos necessários para se acreditar até na possibilidade de um acordo mundial na capital do Peru durante a COP-20 que será realizada mês que vem.
"A China provoca uma mudança de posição do G-77", disse ela, referindo-se à coalizão dos países em desenvolvimento. "O discurso do clima não é mais ambiental, é econômico. Precisamos debater sobre o modelo de desenvolvimento que queremos", afirmou a ministra.
Durante toda a manhã, num auditório com luz e clima naturais, foi esse o tema em pauta. A ideia de Israel Klabin, presidente da FBDS, foi reunir os estudos em seis cadernos com os temas que, de fato, trazem a questão para bem perto dos cidadãos comuns: água, energia, transportes, resíduos sólidos, agricultura, mercado financeiro. Na plateia, nomes de peso do meio ambiente nacional e alguns jornalistas, eu entre eles.
Nos estudos há algumas novidades, muitas críticas, sugestões à beça. E impasses, os mesmos que teimam em descortinar o desafio que a humanidade tem pela frente. Mas o foco foi o Brasil, um país que, como lembrou Marilene Ramos, ex-presidente do Instituto Estadual do Ambiente do Rio de Janeiro (Inea), ainda tem problemas do século XIX e, ao mesmo tempo, precisa lidar com a questão do século XXI, das mudanças climáticas.
"Em 2004, tivemos uma crise hídrica parecida com a que estamos vivendo hoje, mas parece que não aprendemos nada. Talvez com indicadores a gente pudesse resolver isso, mas mesmo os dados existentes são falhos. Fico revoltada, por exemplo, quando olho os dados do IBGE: a Baixada [Fluminense] não tem 90% de abastecimento de água, como eles mostram. E muitas vezes esse dado serve para uma cortina de fumaça da realidade. A crise atual está nos mostrando também que precisamos reservar, mas nossos níveis de perda de água no Brasil são irresponsáveis", disse ela.
Marilene Ramos lembrou também que o nível de desenvolvimento econômico brasileiro não é compatível com o desenvolvimento sanitário. E é imprescindível que esses dois indicadores caminhem juntos: "Tem dinheiro, mas ou faltam projetos ou os recursos são mal aplicados".
Mobilização da sociedade
Os estudiosos que se propõem a ter uma visão mais ampla sobre o meio ambiente, entendendo que é preciso vinculá-lo ao dia a dia das pessoas comuns, ainda hoje têm dificuldades para convencê-las disso. O ambientalista Fábio Feldman lembrou que não é fácil mobilizar a sociedade porque é uma agenda complexa, mas a ideia é continuar tentando – mesmo que numa ocasião tão propícia para isso, como as eleições para a presidência da República, o tema tenha ficado radicalmente fora de pauta.

"Se vier um novo acordo internacional substituindo Kyoto, nós temos que saber como nos antecipar. É bom lembrar que quando o Protocolo foi assinado, em 1997, não havia obrigações para o Brasil", disse ele.
O tema resíduos sólidos foi mais um mega desafio posto em debate na manhã desta segunda. José Penido, ex-presidente da Comlurb, causou impacto ao lembrar a dificuldade que alguns municípios podem estar tendo para acabar com os lixões, como exige o Plano Nacional de Resíduos Sólidos.“Alguém pensa nos catadores? Do que eles vão sobreviver? Só como informação: o Lixão de Gramacho teve que pagar R$ 14 mil a cada um dos 1.600 catadores que trabalhavam ali. Outras cidades tiveram que fazer isso também”, disse ele.
Penido listou ainda outro problema criado pelo fechamento de um lixão: o chorume, líquido resultante do processo de putrefação dos resíduos orgânicos. É preciso criar um sistema de tratamento desse líquido, o que não é barato. “Em Gramacho, gastamos R$ 80 mil por dia, é uma despesa. Os municípios pequenos não têm condições de fazer isso”, disse Penido. Há solução? Para ele, é preciso apostar cada vez mais no sistema de compostagem para poder resolver o material orgânico – e as pequenas cidades deveriam investir em compostagens caseiras.
Em resumo, é o seguinte: lixões são um grande mal por todos os problemas que conhecemos. Mas acabar com eles não é simples. O governo federal ajuda, empresta dinheiro aos municípios, mas manter um aterro é tarefa que exige também planejamento: “Se falta um manobrista de trator durante uma semana, vira tudo lixão outra vez”, disse Penido. A ministra Izabella lembrou que mais de dois mil municípios já conseguiram se organizar e acabar com os lixões, mas que o Plano Nacional, de fato, é criticado por não dialogar com a realidade de cada cidade.
Camada de poluição é vista no horizonte de vista da Zona Oeste de São Paulo
Já lhe bastam tantos problemas, leitor? Ainda temos muitos mais. Nosso espaço na atmosfera para emitir CO2 dura apenas vinte anos, segundo os cálculos feitos pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC na sigla em inglês), lembrou Oswaldo Lucón, que apresentou o estudo sobre energia.

O pesquisador brasileiro, que participa dos estudos do Painel, acha que acordos internacionais sobre emissões podem ser lidos como barreiras comerciais. “Com o acordo feito em Copenhague, de limitar em 2°C o aquecimento global, nós teríamos que já definir nosso pico de emissão em algum ano”, disse ele.
De novo: há solução?  Sim, garante Lucón, embora reconhecendo que não existe bala de prata. É preciso considerar as tecnologias, como a que prevê enterrar o carbono, e opções de fontes de energia mais limpas, como a nuclear e as hidrelétricas. E a indústria precisa ser chamada a participar. As automotivas podem, por exemplo, combater o que Lucón chama de “obesidade veicular”, pondo nas ruas carros menores, mais fáceis de caber em qualquer espaço.
Há muitos outros desafios, algumas soluções que ainda me parecem distantes da nossa realidade e nenhuma certeza. Há também expectativa, como lembrou a ministra Izabella, de que o acordo anunciado por duas potências abra caminho para novidades no setor. Mas é preciso muita cautela para que a economia verde não seja alternativa para o desenvolvimento sustentável, alertou a cientista Suzana Khan, também membro do IPCC, que apresentou um estudo sobre transportes, um dos setores mais poluentes.
É preciso diminuir as emissões dos transportes, sim. Mas, para o cidadão comum, antes disso é preciso que o transporte público garanta a ele mais qualidade de vida, menos espera, menos perda de tempo no trânsito.
Falou-se ainda sobre agricultura, sobre a possibilidade de uso de adubos orgânicos. Celso Lemme, professor Instituto Coppead de Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro, referência no campo da sustentabilidade corporativa, terminou a manhã apresentando seu estudo sobre o sistema financeiro. Afinal, se estamos querendo traçar uma linha para um outro tipo de desenvolvimento, o mercado precisa estar sentado à mesa de debate.
Lemme conta que sempre está presente nas rodas de discussões sobre meio ambiente, e lá não vê economistas. Assim como, quando está em casa, discutindo o sistema financeiro, não vê ambientalistas por perto. É ainda um debate dos mesmos com os mesmos.
"Para os capitalistas, os verdes são sonhadores irresponsáveis e, para os ambientalistas, os do mundo financeiro são capitalistas cruéis". Está na hora de acabar com isso, acredita o professor. Eu apoio.
Os estudos encomendados pela FBDS serão publicados, na íntegra, no site da organização.
*Imagens:Foto de arquivo mostra último caminhão de lixo jogado no aterro de Gramacho (RJ), hoje desativado. (Janaína Carvalho/G1)Camada de poluição Zona Oeste de São Paulo (Marcos Bezerra/Futura Press/Estadão Conteúdo)

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