Com o título “A arte de reconhecer os próprios erros”, eis artigo do jornalista e sociólogo Demétrio Andrade. Ele aborda a dificuldade que todos temos de reconhecer nossos erros. Confira:
Uma das maiores dificuldades da raça humana, sem dúvida, é reconhecer os próprios erros. E olha que não é uma coisa que se aprende na escola: desde bem pequenos dissimulamos, mentimos, responsabilizamos o irmão mais novo, não assumimos para nossa própria mãe a traquinagem que fizemos. Parece ser genético, um componente rasteiro de nossa natureza.
A tendência instintiva a “tirar o nosso da reta” é um capítulo bem formulado no livro da individualidade. Primeiro eu, o resto que se resolva. Um problema de graves proporções que é levado para a universidade, local de trabalho, núcleo de amigos, espaços religiosos e todas as demais esferas da convivência social. O sentido da coletividade entre humanos é lição de casa e de rua. E o uso da expressão “eu errei” numa sociedade que exige perfeição e competitividade pode ser traduzido como um atestado de incompetência, fracasso e derrota. Besteira. É justamente o contrário do que se costuma acreditar.
Assimilar a pancada das consequências de um erro pode apresentar-se, à primeira vista, como um pensamento insuportável. Mas ao tentarmos jogar a culpa de um erro nosso no outro, no destino ou nas contingências, perdemos uma chance maravilhosa de crescer – ou aprendendo com o erro ou exercitando a humildade ou nos fortalecendo após superarmos os conflitos. Não conheço melhor forma de compreensão do mundo do que errar sucessivamente. Aliás, já imaginou o peso de guardar o segredo de um erro dentro de você durante dias, meses, anos? Acho que é isso que Cristo quer expressar quando nos diz “a verdade vos libertará”.
Mas não é só isso. Quem assume o erro tem um poder inimaginável: acalma ânimos, encerra discussões, evita brigas. E não se surpreenda se, mesmo após ser execrado num primeiro momento, as pessoas, posteriormente, lhe confessarem admiração pela sua coragem. Justamente por tratar-se de uma qualidade rara, você acaba sendo valorizado por isso.
Claro que, se você tem certeza que está correto, aguente firme e vá pra cima defender seu ponto de vista. Mas por várias vezes, principalmente em minha vida profissional, desmantelei o ímpeto de quem queria comer meu fígado dizendo simplesmente: “é, tá errado, me desculpe, vamos corrigir”. Experimente. Você se sentirá como Moisés abrindo o mar vermelho. E, mesmo que o oceano inteiro caia sobre você depois, ninguém lhe tirará a oportunidade de aprender a nadar e voltar à superfície.
* Demétrio Andrade
Jornalista e sociólogo.
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