Com o título “A Espanha serve, seus médicos não”, eis artigo do sociólogo Geraldo Bandeira Accioly. Ele aborda a polêmica em torno da importação de médicos para atender às populações do Interior do País. Também lamenta que tantos profissionais da área prefiram viver aparecendo em colunas sociais. Confira:
Há uma boa discussão na sociedade brasileira sobre a importação de médicos, sobretudo um ranço com os cubanos. Credito esta postura ao anti-castrismo obtuso e também a notória ignorância sobre os excelentes índices alcançados na educação e saúde na terra de Guevara, embora a Ilha não seja um paraíso. Acompanhei na Prefeitura de Icapuí a vida e a prestação de serviços de saúde de vários médicos cubanos. Seria interessante que se fizesse uma pesquisa junto aos moradores para avaliar como foi a passagem dos cubanos por lá. Conversei muitas noites com os cubanos e também com os usuários. Uma deficiência que eles (cubanos) não entendiam era a falta de um serviço secundário eficiente de saúde. Os que foram contratados para Icapuí tinham especialidade no atendimento a prevenção, para o PSF(Programa de Saúde da Família). Quando viravam plantonistas do Hospital era um horror, pois tinham dificuldades em conviver com partos e facadas.
No Brasil criou-se um código: “médico que vai para o interior tem que fazer tudo”. É claro que isto é um absurdo. Os cubanos não fazem ou tem muita dificuldade em “fazer tudo”. Portanto, tem que haver uma rigorosa seleção para se definir com clareza os critérios de contratação e lotação. Na conversa com a população, na minha visão, existia aprovação. Moravam na cidade, não chegavam segunda-feira a tarde e não saiam quinta-feira a noite ou mais cedo, “matando” muitas vezes o atendimento da tarde. As consultas eram longas, atenciosas, perguntavam a sintomatologia, auscultavam, aferiam a pressão e alguns pacientes ficavam irritados quando não havia prescrição de medicamentos. Eles moravam lá. “Venha me ver na próxima semana,” diziam.
Mudando de nacionalidade. É comum nas colunas sociais ou em páginas “especializadas” no tema saúde a fotografia de médicos, esposas e filhos na frente de grandes hospitais na Europa e nos USA. Certo dia apareceu a foto da esposa segurando o diploma do marido afirmando que naquela universidade, o grande prêmio Nobel sicrano teria também se formado. Tem de tudo, até mesmo um doutor na frente do museu do Elvis Presley… No fundo todas essas manifestações são associações para demonstrar “saber, competência e status” capturados fora do Brasil, passando sempre a imagem: “tudo que vem de fora é melhor.” O nome da patologia é colonialismo, mais conhecida como complexo de vira-lata. Na prática, uma “política” de vaidade e “valorização” do curriculum.
Interessante que nunca aparece o doutor ou a doutora numa foto mostrando a melhoria de um índice de saúde numa singela foto em um posto de saúde no Bom Jardim atendendo um pobre, preto e desdentado. Por que ? Não sei, embora todos ultimamente tenham ido pras ruas defender o SUS. Estranhamente nas colunas sociais aparecem muitas fotos de ilustres jalecos cearenses nas universidades e hospitais espanhóis “autenticando” os conhecimentos lá recebidos. A pergunta é: se as universidades espanholas são competentes, porque seus médicos não servem? Por que não podem vir trabalhar no Brasil? Adiante com o debate. Gracias.
* Geraldo Bandeira Accioly,
Filósofo e Mestre em Sociologia
geraldoaccioly@yahoo.com.br
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