Por isso, acrescento às dimensões acima referidas, estas duas: aprender a cuidar e aprender a se espiritualizar.
Sabemos que a razão intelectual, como a temos hoje, é recente, possui cerca de 200 mil anos quando surgiu o homo sapiens com seu cérebro neo-cortical. Mas antes dele, surgiu há cerca de 200 milhões de anos, o cérebro límbico, por ocasião da emergência dos mamíferos. Com eles, entrou no mundo o amor,o cuidado, o sentimento que se devotam à cria. Nós humanos, esquecemos que somos mamíferos intelectuais. Logo, somos fundamentalmente portadores de emoções, paixões e afetos. No cérebro límbico reside o nicho da ética,dos sentimentos oceânicos como os religiosos. Antes ainda há 300 milhões de anos, irrompeu o cérebro retilíneo que responde por nossos reações instintivas; mas não é o caso de abordá-lo aqui.
O que importa é que hoje temos que enriquecer nossa razão intelectual com a razão cordial, muito mais ancestral, se quisermos fazer valer o cuidado e a espiritualidade.
Sem essas duas dimensões não iremos nos mobilizar para cuidar da Terra, da água, do clima, das relações inclusivas. Precisamos cuidar de tudo, sem o que as coisas se deterioram e perecem. E então iríamos encontro de um cenário dramático.
Outra tarefa é resgatar a dimensão da espiritualidade. Ela não deve ser identificada com a religião. Ela subjaz à religião porque é anterior a ela. A espiritualidade é uma dimensão inerente ao ser humano como a razão, a vontade e sexualidade. É o lado do profundo, de onde emergem as questões do sentido terminal da vida e do mundo. Infelizmente estas questões foram tidas como algo privado e sem grande valor. Mas sem sua incorporação, a vida perde irradiação e alegria. Mas há um dado novo: os neurólogos concluíram que sempre que o ser humano aborda estas questões do sentido, do sagrado e de Deus, há uma aceleração sensível nos neurônios do lobo frontal. Chamaram a isso “ponto Deus” no cérebro, uma espécie de órgão interior pelo qual captamos a Presença de uma Energia poderosa e amorosa que liga e re-liga todas as coisas.
Alimentar esse “ponto Deus” nos faz mais solidários, amorosos e cuidadosos. Ele se opõe ao consumismo e materialismo de nossa cultura. Todos, especialmente os que estão na escola, devem ser iniciados nessa espiritualidade, pois nos torna mais sensíveis aos outros,mais ligados à mãe Terra, à natureza e ao cuidado, valores sem os quais não garantiremos um futuro bom para nós.
Inteligência cordial e espiritualidade são as exigências mais urgentes que a atual situação ameaçadora nos faz.
* Leonardo Boff é colunista do JBonline e escreveu Saber cuidar, Vozes 2000 e O cuidado necessário e Vozes 2013.
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