"Hiroshima mon amour" ("Hiroshima meu amor"), filme de Alain Resnais, de 1959, com roteiro de Marguerite Duras, considerado o início da Nouvelle Vague – movimento que revolucionou o cinema nos anos 1960 –, marcou profundamente minha vida. Vi esse filme assim que chegou ao Brasil. Eu devia ter lá meus 18 ou 19 anos. Gostava desses filmes e da sua forma. Adorava ir com meu irmão mais velho ao cinema Astória, ali no Bar 20 em Ipanema. Íamos a pé e voltávamos repletos de felicidade caminhando até nossa casa na praça Belfort Vieira 9, que ficava quase no Jardim de Alá. Varávamos a madrugada comentando os filmes, mas este, com a bela atriz Emmanuelle Riva (foto ao lado), foi especial.
É um filme sobre a bomba de Hiroshima. Um filme sobre o amor em tempos de guerra. Cenas de amor vividas pela personagem, em Nevers, na França de 1945, com seu amante alemão, se misturam a cenas de amor vividas com seu amante japonês em Hiroshima. Muitas fotografias do dia 6 de agosto de 1945, quando a bomba atômica em alguns segundos matou duzentas mil pessoas na pequena cidade do Japão.
A atriz de "Hiroshima mon amour", Emmanuelle Riva, me impressionou por sua beleza e simplicidade. Lembro de ter comentado com meu irmão sobre sua maravilhosa atuação vivendo o dilema da memória e do esquecimento.
Mas não vou falar do filme e sim de Emmanuelle Riva e do artigo de Dorrit Rarazim, publicado no jornal "O Globo" do dia 2 de novembro. A propósito da morte recente de uma jovem que, “descontente com sua silhueta”, resolveu se submeter a uma aplicação de “hidrogel”, Dorrit discorre sobre cirurgia plástica e descreve os caminhos das mulheres que decidem melhorar o visual com intervenções cirúrgicas de vários tipos. Frisando que as francesas não se rendem tanto a essa tremenda imposição da indústria farmacêutica, a cronista nos dá justamente o exemplo de Emmanuelle Riva, que hoje, aos 87 anos, se apresenta com as marcas da vida e a alegria estampada em um rosto tão belo quanto o de seus vinte anos em "Hiroshima meu amor".
Não sei se todas as mulheres francesas têm mesmo esse desprezo pela indústria da cirurgia plástica e nem sei se envelhecer plenamente é melhor do que lapidar o rosto e o corpo como fez Sophia Loren. Só sei que prefiro o rosto de Emmanuelle Riva ao de muitas mulheres que envelhecem com rostos e corpos esculpidos e modelados a partir de uma cara alheia.
Pensando sobre o tema do envelhecimento e da juventude lembrei-me do jovem médico que me acompanha nos meus exercícios na clínica MedSport, Sergio D’Agostini: “O corpo é importante porque sem ele não há vida”. Por isso, fico feliz em saber que há quem, como eu, prefira o amor à vida e siga batalhando para manter o corpo saudável sem recorrer ao bisturi de clínicas clandestinas ou não. Como Emmanuelle Riva, que além de atriz é boa poeta, acho que vou gostar da vida até a morte. Como Emmanuelle Riva com o seu rosto marcado e sorriso largo, posso dizer que gosto da sensação de estar viva.
*Foto: Wikimedia Commons; Lucas Jackson/Reuters
Comentários
Postar um comentário